A fotografia, para além de ser uma forte ferramenta de documentação de eventos e histórias, permite, igualmente, que quem esteja por detrás da câmara seja mais que um mero observador que clica num botão para capturar um momento. Assim, todo o fotógrafo é um narrador que tem a possibilidade de acrescentar mais significado e contexto à imagem, sendo capaz de expor lados mais vulneráveis ou trazer novas perspetivas ao de cima.
No mundo do fotojornalismo, onde a capacidade de transmitir emoções é essencial, Annie Lebovitz é uma figura a destacar. Com uma experiência de mais de 50 anos, Lebovitz já capturou desde as mais icónicas figuras da cultura, como atores, desportistas, e músicos, até figuras políticas como é o caso da rainha Elizabeth II.
A sua carreira começou em 1970 na famosa revista Rolling Stone, tendo chegado ao cargo de fotógrafa chefe em apenas 3 anos. É neste período de transformação cultural da década de 70 nos Estados Unidos, que Annie ganha reconhecimento, em especial com a fotografia
de John Lennon e da sua esposa Yoko Ono, horas antes do falecimento do músico dos Beatles. Nesta fotografia, Lebovitz tenta recriar algo parecido à cena do beijo da capa do álbum Double Fantasy. Para tal, conseguimos ver Lennon completamente nu abraçado a Yoko que se encontra vestida, representando a intimidade entre ambos, algo que já era retratado na imagem da capa do álbum, mas que aqui conseguiu ser amplificado.
Este é um dos exemplos que mostra perfeitamente como a fotógrafa ultrapassa a barreira de capturar uma simples imagem, acabando por registar não só a essência da cultura da época, mas como também tem a capacidade de mostrar ao público que aquelas figuras públicas são humanas, reais e sensíveis, e não apenas inalcançáveis e desprovidas de emoção. Esta habilidade de criar intimidade e humanizar as figuras retratadas, permite que quem as esteja a ver posteriormente se ligue mais às mesmas, tornando-as mais impactantes e memoráveis.
A capacidade em representar a personalidade e a vida interior de todos os que são fotografados, é uma das maiores qualidades de Annie que nos lembra que a fotografia pode ser elevada ao estatuto de arte, transcendendo o tempo e o espaço, enquanto que ao mesmo tempo é uma forma de
documentar, questionar e inspirar toda uma sociedade. Como reflexo e exemplar perfeito, temos a imagem de Caitlyn Jenner como capa da Vanity Fair em junho de 2015. Considero que não só este artigo, mas também a fotografia em si, foram decisivas no que toca a dar mais visibilidade a pessoas transgénero, documentando não só um momento crucial da figura pública, como também trazendo consciência e aceitação perante esta comunidade.
Na fotografia, vemos alguém que se encaixa naquilo que são considerados os padrões de uma mulher perfeita, atraente ao olhar público, representada de forma sedutora dentro de uma estética, de certa forma male gazeficada. Deste modo, a fotógrafa conseguiu jogar com os pré-conceitos estabelecidos pela sociedade e com a representação desta personalidade que tinha acabado de fazer a sua transição de uma figura masculina para uma feminina, com o objetivo de não só trazer visibilidade a este género de situações, com o intuito final de estas serem normalizadas, mas também com o objetivo de trazer aceitação moldando, então, o pensamento público.
Em suma, o fotojornalismo é uma forma de contar histórias por meio de imagens, registando momentos e conferindo-lhes significado e contexto. Por este motivo, podemos afirmar com toda a certeza que Annie Lebovitz, é um nome influente no que toca à fotografia de imprensa, na medida em que não se limita apenas a registar eventos, mas sim a criar toda uma narrativa visual à sua volta, através de composições meticulosas e criativas que se foram moldando com o tempo e que nunca permanecem iguais, adaptando-se a cada situação de modo a colocarem as suas criações fotográficas num patamar único e duradouro.
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